quarta-feira, fevereiro 17

Room

O mundo é aquilo que o ser humano pensa conhecer.

Room é uma história dramática, trágica, comovente, arrebatadora, monstruosa e mágica. Tudo adjectivos que entre si culminam numa relação entre mãe, filho e o mundo diferente que ambos conhecem. No fundo é um triângulo amoroso, circunscrito num cubo de paredes espessas e realidades diferentes.
Há anos atrás tive este livro na mão, na altura não tinha dinheiro no bolso para o comprar, voltei à livraria no dia seguinte e já não o encontrei. Não voltei a encontrá-lo. Não voltei a procurar, nem voltei a ler mais do que aquilo que tinha lido naquela "breve" passagem (que no meu caso nunca é breve) pela livraria que com a crise fechou. Por este motivo, não conheço o romance de Emma Donoghue e não posso comentar as suas semelhanças com o filme.
A película tem momentos claustrofóbicos e angustiantes, arrepia, desafia os limites da imaginação e comove. Tudo isto é possível porque temos uma história muito original, com bases bem estruturadas e metáforas suaves, que se perdem num argumento com altos e baixos. Há momentos no filme que quebram o "ritmo" dramático e que não o deixam brilhar como era suposto.
Lenny Abrahamson consegue uma realização intimista, que consome o ar do espectador, mas que se vai desvanecendo com o decorrer da acção, tornando-se mais fria e inconsistente,
Brie Larson tem uma interpretação excelente, consegue momentos de tensão, de desespero e de emoção que nos comovem e nos permite sinergizar com a personagem. Contudo, perde alguma credibilidade em duas cenas chave do filme, o que limita a empatia do espectador com a actriz.
Jacob Tremblay é a mais valiosa peça deste puzzle cinematográfico. Tem uma interpretação absolutamente sublime. É espantoso o olhar da criança em momentos magnéticos do filme, chega a ser imperativo ver Room só pela revelação deste actor.
A sensação com que o espectador fica é que há algo que não está completo, falta qualquer ingrediente que não é possível transmitir por palavras. No entanto, é um filme que vale a pena ver pela história, pelas personagens, pelo o mundo que cria em seu redor dentro de quatro paredes.

quinta-feira, fevereiro 11

Knight of Cups


Um homem que se perde em si próprio, nunca se encontra sozinho.

Terrence Malick é um realizador de poucas palavras, é claramente um criador de experiências sensoriais no grande ecrã. Um homem que criou um estilo único e muito próprio, que criou a sua assinatura no cinema. Knight of Cups refugia-se nesse estilo melodioso, perde brilho numa narrativa sem grandiosidade, sem interesse e que não prende o espectador. Não existe uma razão para o filme acontecer, não há espaço para que se desenvolva. Todas as narrativas de Malick são bem fundamentadas, bem estruturadas, solidificadas, com um sublime toque de encanto. Filmes com este poder visual têm de ter argumentos igualmente poderosos, e isso não acontece com Knight of Cups.
Tal como o protagonista, a história está perdida, baseando-se apenas em retalhos e exibindo dolorosamente a sua falta de rumo e de conteúdo. Visualmente o filme é bonito, emotivo, mas é só isso.
Christian Bale tem uma interpretação razoável, nada de extraordinário, nada de estrondoso. Percebe-se que não existe um fio condutor na construção da sua personagem. Cate Blanchett consegue prender o espectador e é um ponto forte e sólido no filme. É possível perseguir um caminho com ela no ecrã e na história. O mesmo acontece com Natalie Portman que abre uma porta e permite a entrada da razão da existência de toda esta narrativa, mas devido à sua chegada tardia na película isso torna-se complicado, não sendo o suficiente.
As ideias por detrás da história de encontro pessoal como os devaneios da vida mundana, a procura de compreensão, a descoberta do amor, são tudo temas implícitos mas que não ficam claros e que não são tocados o suficiente para que a história fique completa e lógica. Falta-lhe conexão entre todos os elementos. As próprias cartas que representam a procura, que simulam a vida, não se encontram ligadas. A narrativa vive muito de especulação e não parece estar trabalhada para ser mais que isso.
Knight of Cups tem potencial para ser uma curta-metragem magnetizante, mas não tem conteúdo para ser uma longa-metragem, torna-se muito redundante.

Spotlight


A verdade escondida diante dos nossos olhos.

Todos conhecemos a história de Spotlight do ponto de vista de espectador, no prisma jornalístico este caso parece ser mais complexo do que alguma vez se imaginou. A narrativa deste filme está bem construída, humanizada, fundamentada e extremamente bem interpretada.
Spotlight tem a enorme vantagem de reunir um elenco poderoso e um argumento extremamente envolvente. Josh Singer tem experiência neste tipo de narrativas e tem surpreendido pelo seu crescimento neste sector. Não tenho grandes dúvidas que a sua experiência aliada à de Tom McCarthy terá sido o grande sucesso deste poderoso argumento. Tom McCarthy é um actor experiente, um argumentista interessante e um realizador verde. Apesar da sua inexperiência na realização McCarthy apresenta-nos um filme maduro e completo. O projecto não está arrojado nem arriscado, mas a simplicidade e a solidez torna-o íntimo e próximo do espectador. Não é uma realização espantosa nem sensacional, mas é segura.
O filme tem tudo na dose certa e isso é essencial nestes temas sensíveis que correm o risco de se tornarem muito dramáticos, muito subjectivos e/ou muito aborrecidos.
Nos actores é difícil referir alguém que tenha estado menos bem, estão todos muito acima do esperado. Todas as personagens têm uma personalidade e uma humanização muito acentuada, sem excessivos dramatismos, próprios do género, ou discursos surrealistas.Ainda assim destaco o gigantesco Mark Ruffalo que tem uma performance mais que brilhante. O actor consegue balançar muito bem os momentos de drama, as cenas de "acção" e os minutos de reflexão, é hipnotizante vê-lo no grande ecrã. Liev Schreiber tem uma personagem sem grande espaço para desenvolvimento, mas ainda assim consegue torná-la sólida, plausível e sobretudo confiável, acredito que não tenha sido tarefa fácil para o actor. Rachel McAdams não é só uma cara bonita, é uma peça essencial no desencadear da acção dando uma certa sensibilidade a toda a narrativa. Michael Keaton é (e sempre será) um homem de papéis fortes e Spotlight não é uma excepção. Por fim, sem esquecer Stanley Tucci, que dá um toque político interessantíssimo a todo o filme. É relevante perceber que todas as personagens de Spotlight acarretam interesses, expectativas e desejos diferentes, tal como as pessoas. Por esse motivo, o filme torna-se muito pessoal e muito próximo do espectador.

Um filme que prometeu ser menos do aquilo que chegou a ser, e foi absolutamente brilhante!

quarta-feira, fevereiro 10

Revenant



A luta pela sobrevivência de um homem morto.

Revenant uma extraordinária história de sobrevivência que vive de expectativa e surrealismo. 
Alejandro González Iñárritu é um homem verdadeiramente brilhante, tanto na realização como no argumento. Os seus filmes têm magia, têm ódio, têm paixão, têm medo, têm tudo aquilo que os outros não têm. No entanto, Revenant não tem nada disso. Este filme é uma magnífica experiência cinematográfica a nível técnico, arrasa com qualquer expectativa técnica, tem uma qualidade preciosa de realização, montagem, efeitos especiais, efeitos sonoros, banda-sonora e fotografia. Contudo, perde-se num argumento pobre, que não acrescenta nada de novo. Admito que é uma história complicada de ser contada, mas aliada à brilhante realização poderia ter ido muito, mas muito mais longe. Mark L. Smith é um argumentista que conheço muito pouco, apenas vi três filmes dele, os quais não achei nada de especial. Parece-me uma personalidade ainda muito verde para este nível de filme, mas não posso afirmar claras certezas.
Leonardo DiCaprio é um maior e o melhor trunfo deste filme. Sem este actor garantidamente que este filme não seria nem um quarto daquilo que foi. DiCaprio tem o incrível dom da representação em silêncio, ele não precisa de diálogo, não precisa de som, não precisa de cenário, precisa dele próprio e de uma personagem que lhe dê espaço para fazer aquilo que ele sabe fazer melhor. O actor tem um performance magnífica, de uma beleza rara, que aliada a estrondosa e inovadora realização cria momentos magnéticos no filme.
Tom Hardy está irreconhecível, um fenomenal trabalho de caracterização. A interpretação do actor está igualmente à altura do seu "disfarce". Hardy usa e abusa da sua personagem e torná-a verdadeiramente assustadora e poderosa. É o segundo grande trunfo desta película.
Revenant é uma história banal, composta por momentos cinematográficos monumentais, por performances extraordinárias, com uma realização rara e única. Mas, infelizmente, é apenas isso, um filme visualmente explosivo.