sexta-feira, junho 13

Aritmética Vindicta - Parte C

Salvador passou o dia intrigado, suspirando a cada esquina dos corredores doentios do hospital, quem seria Petra? Era a pergunta que o perseguia, ou melhor, era ele que perseguia a pergunta, na realidade somos nós que criamos as questões, e tal como uma mãe persegue um filho, nós perseguimos as nossas próprias questões. A noite caiu e ele teve de regressar a casa, assim que pôs a chave na estreita fechadura, ouviu o som abafado dos chinelos de Vitória, a sua mal amada e esquecida mulher, aquela que por força do amor e do dever ocupou todo o seu tempo a cuidar da casa. - Olá amor! – Disse a encantadora voz aguda, daquela que poderia ser a melhor esposa de sempre. – Olá querida, como foi o teu dia? – Vitória aguardava ansiosamente todo o dia por aquele momento, os minutos que o marido dedicava a ouvir detalhadamente cada episódio emocionante do seu dia. Salvador nunca ouvia o que a mulher dizia, aguardava pacientemente que ela terminasse para que se pudesse sentar a jantar silenciosamente com os seus incompletos pensamentos. Desta vez sentia-se ridicularizado, mas atraído, frustrado, mas interessado. Dificilmente conseguiria equilibrar o que sentia, a nuvem turva de fascínio e indignação não permitiam que o fizesse. – Está tudo bem querido? – Perguntava Vitória preocupada. – Está. Estou apenas cansado, preciso de me deitar cedo. – Vitória sorriu, beijou a testa do marido e acariciando-lhe o rosto. – Então vai. Eu trato disto. – Salvador beijou calorosamente a mulher, pensando que tinha a maior sorte do mundo em tê-la encontrado, no entanto, Petra não abandonava o seu pensamento.
Salvador estava sentado numa poltrona no seu quarto, repousava a mente e o espirito. Quando finalmente se encontrava na penumbra entre o sono e a realidade ouviu uma voz sussurra-lhe ao ouvido: - Rua Porto Venâncio, nº 43. – Salvador acordou sobressaltado. Porque estaria ele a recordasse da rua onde vivia enquanto criança? Ele morava no número 33 e não no número 43. No seu interior sentiu uma impetuosa vontade de caminhar até ao nº 43, era só meia hora de carro. – Querida tenho uma urgência. – Mas… - Eu venho cedo! – Salvador antecipou-se à intervenção da mulher, ela não discutiu, ela não argumentou, remeteu-se ao silêncio e continuou o seu trabalho de doméstica.

Salvador dirigiu o carro a uma velocidade vertiginosa, não se conseguia controlar, o seu lado racional murchou, deixando espaço para florescer aquilo a que chamamos emoção, não havia explicação lógica. Estacionou o carro quase em frente ao nº 43 e correu até lá. Tocou à campainha, esperou, não sabia o que iria encontrar, não sabia o que dizer. Foi assaltado por um momento de lucidez e correu novamente para o carro, espreitando quem viria abri-lhe a porta. E lá estava ela, Petra, a mulher mistério era sua vizinha desde sempre. Teve medo de sair do carro, teve receio de falar, assim que ela fechou a porta ele suspirou de alívio, colocou a cabeça em cima do volante, e fechou os olhos, manteve-se assim por tempo indeterminado. Finalmente saiu da posição de repouso, e apercebeu-se que alguém tinha entrado para o banco de trás, assim que desviou o olhar para desvendar o mistério, viu-a novamente, Petra. – Olá boa noite! O que faz por aqui? – Salvador olhou para ela assustado. Naquele momento sentiu-se louco. Estaria?